segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Auto-ajuda ou Auto-engano?

Outro dia, tive este insight (auto-ajuda ou auto-engano?) quando estava pensando sobre o que leva uma pessoa a buscar ajuda psicoterapêutica, e não apenas isso, mas o que a leva a um engajamento verdadeiramente efetivo no processo. É extremamente comum (no senso comum) ouvir as pessoas dizerem: "psicologia é coisa pra gente doida!", "meu psicólogo só fica ouvindo e não fala nada...", "não preciso pagar alguém só pra conversar..." estas e outras muitas frases demonstram que existe um total desconhecimento do que um processo psicoterapêutico sério é capaz de realizar em benefício daqueles que buscam ajuda em momentos de sofrimento. O professor José Paulo Giovanetti gosta sempre de dizer que "o objetivo maior de um processo psicoterapêutico é lidar com o sofrimento humano, não no nível da razão, mas dos sentimentos."

É interessante pensar e fazer questionamentos como o proposto no título deste post, pois vivemos em um mundo em que a maioria das pessoas busca respostas imediatas para suas questões interiores, as quais, elas, muitas vezes, para não dizer quase sempre, não reconhecem as causas e muito menos sabem lidar com as consequências. Sem dúvida, isso provoca grande sofrimento psíquico e certamente trás consigo, reflexos de somatização e profunda angustia. 

Primeiro, faremos uma breve reflexão sobre o termo auto-ajuda. De acordo  com a professora Dra. Daniela Bessa (2008), "a literatura de auto-ajuda teve início no século XVII, atrelada à religião cristã, ao auto-conhecimento como condição essencial para a santidade e ao serviço cristão. Tudo o que fosse desenvolvido e aprendido pela pessoa, individualmente, deveria ser colocado a serviço da coletividade. No final do séc. XIX o apelo à coletividade cedeu lugar à individualidade como exigência. O conceito de auto-ajuda passou a ser a busca desmedida pelo sucesso pessoal e pela aquisição de habilidades, tendo como foco o desenvolvimento pessoal". Partindo desse pressuposto, percebe-se que existe um problema nisso que estamos tentando identificar como sintoma e um certo narcisismo como característica fundante da pretensão ingênua de se auto-analisar. Christopher Lach (in Bessa, 2008) utiliza a expressão 'narcisismo' para se referir à exacerbação do individualismo e a busca hedonista do ego que se toma como objeto de amor, o narcisismo secundário freudiano. Ele define a sociedade atual como marcada por um individualismo competitivo, em que a busca pela felicidade é a palavra de ordem. E, com tal alvo, apenas ao presente interessa; o passado e o futuro são desconsiderados, o que promove não apenas a pobreza interior, mas a falta de valores : "permitimos que especialistas definam por nós nossas necessidades e, depois, nos surpreendemos desejando saber por que essas necessidades jamais parecem satisfeitas".  De posse disso é possível perceber que o prefixo "auto" vem carregado de uma ideologia que revela a suficiência do sujeito, ou o engano quanto a não necessidade de um 'outro' no seu processo de conhecer-se. 


Neste sentido, faz-se necessário descrever aqui o que chamo de auto-engano. Não se trata apenas de um movimento da razão em busca de respostas momentâneas que aliviem o sofrimento do sujeito, mas de um mecanismo que protege  aquilo  que não quer se desvelar. Sabe-se, por exemplo,  com raras exceções, que nos primeiros encontros terapêuticos surgem apenas as queixas aparentes do real motivo do sofrimento trazido pelo sujeito. Em outras palavras, pode-se dizer, nesse momento, que os mecanismos de defesa mais arcaicos, como a negação, são ativados, pois ainda não se estabeleceu um vínculo de confiança que possibilitou a abertura para falar daquilo que de fato está causando o sofrimento. Esse ocultamento do núcleo causal verdadeiro é o que estamos nomeando "auto-engano". Em certo sentido, ele é instintivamente necessário para a proteção, por isso Freud denomina esse movimento psíquico de 'mecanismo de defesa', ou seja, não se trata de um mero engano racional, mas de algo que está no nível dos sentimentos, das ressonâncias internas com que os fenômenos afetam cada sujeito.

Portanto, sem pretensões megalomaníacas de fechar questão sobre a pergunta que intitula este post, a proposta aqui é ajudar os leitores a refletir sobre a importância de buscar auxílio para ouvir-se através da escuta do outro. Uma ajuda profissional séria e com alto grau de envolvimento de ambas as partes é capaz de produzir respostas às mais profundas e difíceis questões do sofrimento humano. Digo "produzir repostas" no sentido de uma reflexão própria que guiará as decisões com cautela, integridade e sobriedade ainda que elas nos façam, em certa medida, sofrer, mas certamente não nos deixarão enganados.

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Referências:

CRITELLI, D.M. Analítica do Sentido. Ed. Brasiliense. 2007.

BESSA, D. B. Literatura de Auto-ajuda Cristã: em busca de felicidade na terra e não só para o céu. Tese de doutorado apresentada à PUC-SP. 2008.


quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Neuriciências e Miguel Nicolelis

Para os amantes da Psicologia integrada à tecnologia, o nome de Miguel Nicolelis precisa ser sempre mencionado. Segundo alguns comentárias, ele é o cientista de maior projeção internacional no campo das Neurociências atualmente, e seu nome tem sido cogitado ao Nobel. Ele investe grande parte de seu tempo e recursos no Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond e Lily Safra - IINN-ELS. Um projeto audacioso com compromisso social.

Esta semana o portal G1 publicou mais uma grande conquista dese brasileiro, leia:

"O neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, que trabalha no Departamento de Neurobiologia da Universidade Duke, Carolina do Norte (EUA), foi um dos escolhidos para receber o Transformative R01 Award dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH, na sigla em inglês). Com isso, terá direito a um financiamento para pesquisas de aproximadamente US$ 4 milhões (quase R$ 7 milhões) .

Ele já havia recebido em julho o Pioneer Award, criado pela mesma instituição em 2004, pelo qual recebeu US$ 2,5 milhões (R$ 4,3 milhões pelo câmbio atual) para dar continuidade a suas pesquisas no campo da interface cérebro-máquina. Nicolelis é o primeiro cientista a receber da instituição americana no mesmo ano o Pioneer e o Transformative R01.
Os recursos oficialmente anunciados nesta quinta-feira (30) deverão ser direcionados ao desenvolvimento de uma nova terapia, menos invasiva, para a doença de Parkinson, baseada em estímulos da medula espinhal (em vez de no cérebro).
O mal de Parkinson é uma doença neurodegenerativa que avança de forma progressiva, causando tremores incontroláveis e espasmos. Ainda sem cura, leva seus portadores à morte."

Fonte: Portal G1, lido em 05/10/2010


quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Retratação Pública


Aqueles que me acompanham e sabem da minha trajetória biográfica entenderão que o texto abaixo publicado faz parte de um momento decisivo e definitivo da minha vida. 
Preciso deixar claro que este meu posicionamento faz parte da minha visão de mundo e das crenças que julgo fundamentais para minha vida.
Essa retratação pretende demonstrar que o sentimento que me toma é de VERGONHA e ARREPENDIMENTO. Não se trata de uma mera discussão teológica e nem de uma retaliação fundamentada em ódio, mas de um retorno a um lugar do qual eu nunca deveria ter me retirado.


Para ler o texto clique:
Retratação Pública

Paz e misericórdia sejam conosco!!!
Aender Borba

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

TDAH

É interessante perceber que ao longo dos anos algumas doenças marcaram momentos sócio-históricos baseando-se nos conceitos de "normalidade" e "anormalidade". Afinal de contas, o conceito de "saúde" e "enfermidade" derivam  diretamente desses debates e variam de acordo com o contexto social em cada época e cultura. 
Na Grécia antiga, por exemplo, a "loucura" era tratada como uma manifestação dos deuses, inclusive os ataques epiléticos eram nomeados como "doenças divinas". 
Na Idade Média, as pessoas consideradas "loucas" eram reconhecidas  como possuídas por espíritos malignos e muitas chegaram a ser queimadas em fogueiras nas praças públicas. 

O que percebe-se, e é muito comum em nossos dias ainda, é que, enquanto algumas doenças não recebem nomes e/ou são catalogadas com reconhecimento médico internacional, elas são tratadas com total descaso pela comunidade médico-científica. Fica aqui minha primeira crítica àqueles profissionais da saúde que, em detrimento a tratar de pessoas, insistem em apenas identificar doenças; não se preocupam com a causa primária e sim com o sintoma. De modo geral, a Psicologia é tributária do modelo médico, por isso alguns profissionais ainda priorizam o roteiro de enquadramento ou adequação à estrutura em que o maior número possível de sintomas apontam para o "nome" do problema, tudo isso sem levar em conta o SER HUMANO que se lhe apresenta com um nível se sofrimento muitas vezes insuportável.
Que fique claro que a crítica que se faz aqui não é ao método utilizado pelo profissional, mas à maneira como se utiliza o método, quando este conduz à desumanização daquela pessoa que clama por ajuda ao buscar uma terapia ou qualquer outro tipo de serviço que a Psicologia poça oferecer.
Apenas para que fique claro o ponto onde pretende-se chegar com este post, pode-se citar como outro bom exemplo de contexto sócio-histórico o que aconteceu no começo da carreira de  Sigmund Freud. Estudando as histéricas, ele percebe que a causa do problema seria bem mais profunda do que os sintomas que se apresentavam. Naquela época a histeria era sinônimo de "piti" "frescura de mulher", etc. 

Os estudos sobre o Transtorno de Deficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) tem avançado muito com grande eficácia e responsabilidade. Esta, se assim pode-se dizer, ainda é uma daquelas doenças em que se ouve dizer: "...isso é  culpa dos pais que não dão limites aos filhos...¨, ou "...tal pessoa é preguiçosa e se esconde atrás da doença para não ter que trabalhar...", e ainda "...ele deve ter algum problema de caráter..." e por ai vai... 
Bastante semelhante à histérica do final do século XVIII, guardadas as devidas proporções, obviamente.
Na verdade, todas estas proposições podem ser verdadeiras se o sujeito que ainda não foi diagnosticado, pra não dizer "rotulado", com este transtorno for ouvido e tratado como pessoa (humana) e não como um doente (sintoma) simplesmente.

Para auxiliar um pouco melhor a compreensão da dimensão do problema, seguem algumas características deste transtorno, e insisto, não é objetivo deste post ensinar a fazer diagnóstico de TDAH, mas alertar para a  seriedade da questão e, caso verifique-se as características sintomáticas em alguém, que um profissional da área seja procurado para o devido tratamento.

As informações abaixo foram extraídas do site da ABDA - Associação Brasileira do Défict de Atenção (www.tdah.org.br) em 22/02/2010.

O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece na infância e freqüentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por sintomas de desatenção, inquietude e impulsividade.
Pelas mais variadas razões, desde inocência e falta de formação científica até mesmo má-fé. Alguns chegam a afirmar que “o TDAH não existe”, é uma “invenção” médica ou da indústria farmacêutica, para terem lucros com o tratamento.
No primeiro caso se incluem todos aqueles profissionais que nunca publicaram qualquer pesquisa demonstrando o que eles afirmam categoricamente e não fazem parte de nenhum grupo científico. Quando questionados, falam em “experiência pessoal” ou então relatam casos que somente eles conhecem porque nunca foram publicados em revistas especializadas. Muitos escrevem livros ou têm sítios na Internet, mas nunca apresentaram seus “resultados” em congressos ou publicaram em revistas científicas, para que os demais possam julgar a veracidade do que dizem.
Os segundos são aqueles que pretendem “vender” alguma forma de tratamento diferente daquilo que é atualmente preconizado, alegando que somente eles podem tratar de modo correto. 
O TDAH se caracteriza por uma combinação de dois tipos de sintomas:
1) Desatenção
2) Hiperatividade-impulsividade
O TDAH na infância em geral se associa a dificuldades na escola e no relacionamento com demais crianças, pais e professores. As crianças são tidas como "avoadas", "vivendo no mundo da lua" e geralmente "estabanadas" e com "bicho carpinteiro" ou “ligados por um motor” (isto é, não param quietas por muito tempo). Os meninos tendem a ter mais sintomas de hiperatividade e impulsividade que as meninas, mas todos são desatentos. Crianças e adolescentes com TDAH podem apresentar mais problemas de comportamento, como por exemplo, dificuldades com regras e limites.
Em adultos, ocorrem problemas de desatenção para coisas do cotidiano e do trabalho, bem como com a memória (são muito esquecidos). São inquietos (parece que só relaxam dormindo), vivem mudando de uma coisa para outra e também são impulsivos ("colocam os carros na frente dos bois"). Eles têm dificuldade em avaliar seu próprio comportamento e quanto isto afeta os demais à sua volta. São freqüentemente considerados “egoístas”. Eles têm uma grande freqüência de outros problemas associados, tais como o uso de drogas e álcool, ansiedade e depressão.

Referencial teórico:

FOUCAULT, Michel. A história da loucura na idade clássica. Perspectiva: São Paulo,1997.
Associação Brasileira de Defict de Atenção, em http://www.tdah.org.br (extraído em 22/02/2010).

 
 

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Linguagem do corpo.

Aender Borba

Minha última visita à terra natal de meus pais (Tiros-MG), apesar de não ter sido por circunstâncias que gostaria, foi de grande proveito, pois tive a oportunidade de rever alguns primos e tios que há muito não os encontrava. Num desses encontros, passei algumas horas com minha prima Amanda, estudante de medicina da Faculdade Atenas (Paracatu-MG), como não poderia deixar de ser, falamos de saúde, saúde mental e um pouco sobre a vida...
Dessa conversa surgiu um tema muito interessante que me arrebatou durante as duas últimas semanas. Amanda mencionou um livro que eu ainda não tinha lido completamente, mas muitos dos meus professores comentaram sobre ele durante algumas aulas, principalmente a de Entrevista Psicológica: "O Corpo Fala" (Pierre Weil e Roland Tompakow). Esse é um tema polêmico, intrigante e  também muito discutido nos meios acadêmicos,  talvez por este  motivo mereceu que o canal de televisão FOX, numa tentativa de mostrar uma faceta estritamente científica da questão, lançasse no início de 2009 uma série chamada "Lie To Me", obviamente marcada pelo hollywoodismo típico americano, mas no geral, muito pertinente ao assunto. 

Interessante notar que existe um viés cientificista que pretende demarcar este território, entretanto, este é um campo em que  nem todas a respostas podem ser fornecidas à luz de um certo positivismo. Autores, como Weil, utilizam-se da semiótica nas civilizações antigas para explicar como uma comunicação reduzida simplesmente às palavras impossibilita que tudo que se pretende transmitir o seja.
A figura ao lado é utilizada no livro de Weil para mostrar que, segundo a tradição, cada parte da esfinge representa uma parte do físico do HOMEM e possui uma correspondência também psicológica. Essa correspondência psicológica não mudou muito até na psicologia moderna. VEJAM:
BOI = abdome = vida instintiva e vegetativa.
LEÃO = tórax = vida emocional.
ÁGUIA = parte da cabeça e asas = vida mental (intelectual e espiritual).
HOMEM = conjunto = consciência e domínio dos três inconscientes anteriores.

Para exemplificar, observe no pequeno roteiro, que segue, de formas simples de comunicação não-verbal que estão bastante próximas de nós, e que na maioria das vezes as negligenciamos. (Insisto que são apenas exemplos não universais de comportamentos e não devem ser entendidos indiscriminadamente ou fora de seu contexto).

1- Discrepâncias entre o que se diz e a linguagem corporal: dizer que "não" e balançar a cabeça para frente e para traz como se dissesse "sim".
2- Prover mais informações e especificidades do que a pergunta requeria.
3- Flutuações pouco usuais na forma de falar, na escolha das palavras e na estrutura das sentenças.
4- Um olhar quando é retribuído é um ótimo indício de que a outra pessoa está interessada.
5- Mulheres quando estão interessadas e percebem que você está olhando, começam a passar a mão nos cabelos ou lambem o lábio superior erguendo as sobrancelhas.
6- Apontar um dedo é sinal de que alguém quer afirmar sua autoridade ou ilustrar um fato.
7- Mãos juntas sobre o colo ou estômago é um sinal de proteção.
8- O gesto de esfregar o queixo é um sinal de que o ouvinte está tomando uma decisão.
9- Braços cruzados e mãos fechadas indicam uma atitude hostil e defensiva.
10- Pernas cruzadas podem indicar uma postura nervosa, reservada ou defensiva.
11- A pessoa que mente reluta em se defrontar com seu acusador e pode virar sua cabeça ou posicionar seu corpo para o lado errado.



12- etc, etc, etc...

Como psicólogo, acredito que a PALAVRA é a maior fonte de matéria-prima para guiar meu trabalho. Entretanto, depois dessa pequena pesquisa, passei a perceber que a LINGUAGEM possui mais recursos que eu imaginava.  Tão importante quanto "saber ler"  e compreender essa linguagem, são: o respeito aos limites éticos das interpretações, o contexto em que surgem e principalmente a permissão do outro para ser lido. Essa conduta deve  nortear a prática de todo bom profissional da psicologia. O inconsciente é um lugar que só pode ser acessado com a permissão absoluta do outro.